segunda-feira, 9 de junho de 2008

Temporada de caça

Uma breve enumeração dos adversários internos de Dilma no PT e na base pode ajudar a entender por que, desde que se tornou a aposta eleitoral de Lula, ela não sai da berlinda

Desde que foi escolhida pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva como aposta preferencial à sua sucessão em 2010, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, não teve um dia sequer de sossego. A denúncia sobre o favorecimento ao grupo Mattlin Patterson na venda da Varig aconteceu na véspera do sepultamento da CPI dos Cartões Corporativos. Ou seja, mal Dilma acabou de se livrar de um abacaxi, começou a descascar outro, talvez ainda mais duro e azedo que o primeiro. Embora ela mesma viva falando de “fogo inimigo”, a própria Dilma sabe: as denúncias estão saindo do seu lado da bancada, de gente bem próxima dela. E Dilma sabe ainda que cada história dessas que a desgasta provoca urros de satisfação em alguns setores petistas.

A história da Varig esconde interesses comerciais. E eles podem estar na origem da denúncia de Denise Abreu. Não custa lembrar sempre que Denise era acusada de beneficiar a TAM na Anac. E a TAM tinha interesse na Varig. Embora a motivação possa estar aí, é verdade também que Dilma coleciona adversários de peso no PT e na base governista. E que eles adoram vê-la desgastada. A intenção aqui é enumerar essas trombadas de Dilma no PT e na base. E avaliar até que ponto tais trombadas podem estar na origem da artilharia que se abate sobre ela.

O primeiro e principal adversário é o antecessor de Dilma na Casa Civil. José Dirceu nunca engoliu a forma como Dilma chegou à Casa Civil. Ele esperava a possibilidade de uma saída negociada, na qual ainda continuasse tendo algumas pontes que o mantivessem em contato com as principais estruturas de poder do governo. Sua expectativa era manter na secretaria-executiva da Casa Civil Swedenberger Barbosa como principal ponte. Tinha nesse projeto o apoio do chefe de gabinete da Presidência, Gilberto Carvalho. Dilma atropelou os dois e trocou Swedenberger por Erenice Guerra, uma de suas assessoras de confiança antes no Ministério das Minas e Energia. Dirceu não perdoou a forma como se deu esse processo. Mais tarde, Gilberto Carvalho acabou levando Swedenberger para trabalhar com ele.

Dilma levou o primeiro choque quando descobriu que fora José Aparecido Nunes o vazador do dossiê com gastos do presidente Fernando Henrique Cardoso com cartões corporativos. Aparecido, o ex-secretário de controle interno, era o único remanescente do grupo de Dirceu na Casa Civil. A entrevista de Denise Abreu provocou o segundo choque. Antes de ser diretora da Anac, ela era nada menos que a assessora jurídica da Casa Civil na gestão José Dirceu. Pode ser mera coincidência, mas Dilma não deixou de considerá-la. Daí a insinuação que fez na entrevista sobre o PAC, ao dizer que estranhava a atitude de Denise Abreu, pelo fato de ela sempre ter sido bem tratada, justamente por ter pertencido ao quadro da Casa Civil na gestão anterior a ela.

Embora esteja hoje distante de Lula, Dirceu continua tendo pontos de influência importantes junto ao governo e ao PT. E, coincidentemente, hoje eles formam exatamente o grupo que mais resiste à candidatura de Dilma à Presidência da República. No governo, além de Gilberto Carvalho, Dirceu tem influência sobre o secretário-geral da Presidência, Luiz Dulci, e sobre o assessor especial Marco Aurélio Garcia. Todos muito próximos de Lula. No processo que levou à eleição do deputado Ricardo Berzoini como presidente do PT, Dirceu fez um acordo tácito com o ministro da Justiça, Tarso Genro. Ajudou a costurar o acerto com a tendência de Tarso, Mensagem ao Partido, que levou o deputado José Eduardo Cardozo a assumir a secretaria-geral do PT, atropelando o deputado Jilmar Tatto. Dirceu continua tendo pelo menos uma reunião com Berzoini e os principais políticos do antigo Campo Majoritário a cada quinze dias para, junto com eles, traçar estratégias para o PT.

O gaúcho Tarso, que em muitos momentos não costuma primar pela discrição, soltou o petardo mais direto contra Dilma. Em entrevista ao jornal Zero Hora há três semanas, Tarso disse publicamente o que muitos petistas têm dito nos bastidores. “Ela não tem militância no partido”, afirmou, questionando, por esse motivo, a viabilidade da sua candidatura. Para o ministro da Justiça, Dilma teria que, primeiro, construir uma base interna para a sua candidatura. E essa sua capacidade de criar um vínculo com o PT é, na opinião de Tarso, “um enigma”. Dilma não escondeu sua irritação com Tarso que, depois da entrevista, saiu de férias. A ministra da Casa Civil pediu formalmente a Lula que, na volta de Tarso, estabeleça um encontro entre os dois para que ela possa colocar a questão em pratos limpos.

Se Dirceu fez com Tarso seu acordo tácito, Tarso, por sua vez, fez o mesmo com o ministro de Assuntos Sociais, Patrus Ananias. Como ambos trabalham com a possibilidade de serem os candidatos petistas na hipótese de um fracasso de Dilma, uniram-se primeiro nos bastidores para desgastar o adversário comum. Paralelamente, trabalha o grupo ligado à candidata à prefeitura de São Paulo, Marta Suplicy. No caso, tanto o Campo Majoritário de Dirceu e Berzoini como o grupo de Marta tem base em São Paulo, que ficaria enfraquecida na hipótese da candidatura de Dilma, patrocinada diretamente por Lula. A turma de Marta espera que ela conquiste a prefeitura e que, a partir daí, volte a se credenciar na disputa interna pela sucessão de Lula.

Pesa ainda contra Dilma a torcida contra de outros partidos da base. A falta de traquejo político é uma das causas. “Nós todos sabemos que Dilma, pelas suas características e origens, não dará a menor pelota para as demandas políticas se virar presidente”, diz um deputado petista com trânsito no baixo clero. Outra causa importante é sua trombada com os caciques do PMDB pelos cargos principais do setor energético, a começar pela própria oposição que fazia à escolha do senador Edison Lobão para o Ministério das Minas e Energia, indicação do senador José Sarney (PMDB-AP). Finalmente, ao virar a aposta de Lula, Dilma naturalmente tornou-se o alvo prioritário da oposição. A exemplo de seu desafeto, José Dirceu, Dilma Rousseff na Casa Civil concentrou muitos poderes e colecionou muitos inimigos. Diante da mesma mistura, pode acabar tendo o mesmo fim de seu sucessor.

Um comentário:

Cartas de Brasília disse...

Parece que a Dilma fica cada dia mais bonita depois de uma briga.

Vejam as fotos mais antigas e as de agora.

Polêmica política faz bem pra pela!