quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Cautela e caldo de galinha ...

É inegável que o cenário projetado a partir da eleição municipal deixa hoje José Serra na condição de favorito para 2010. Mas daí a já colocá-lo sentado atrás da mesa do principal gabinete do terceiro andar do Palácio do Planalto vai uma distância imensa

Já há apressados no mundo da análise política colocando o governador de São Paulo, José Serra, sentado em 2010 na cadeira que fica atrás da mesa do gabinete principal do Palácio do Planalto. A esses apressados, este blog recomenda um pouco de calma. Lembra que, no final do ano passado, na convenção nacional do PSDB que elegeu o senador Sérgio Guerra o presidente do partido, o governador de Minas Gerais, Aécio Neves, dera um banho em Serra. Na ocasião, entrou com claque no meio do discurso de Serra, interrompendo-o. Depois, a mesma claque interrompeu o discurso do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Depois que Aécio rasgou a fantasia e explicitou seus planos naquela convenção, por muitas vezes imaginou-se que era ele quem começava a ficar por cima da carne seca.

Se não bastar, este blog lembra também que, no início da campanha em São Paulo, muita gente apostava que Gilberto Kassab, que tinha então uns 10% de intenção de voto nas pesquisas, não iria até o fim. Mesmo mais perto do final, apostava-se ainda que a disputa entre Kassab e Alckmin seria apertadíssima, o que geraria um tremendo racha no PSDB de São Paulo com conseqüências irreversíveis, sendo que a maior delas seria uma provável vitória de Marta Suplicy. Enquanto isso, em Belo Horizonte, o candidato de Aécio e do prefeito petista Fernando Pimentel, Márcio Lacerda, depois de uma patinada no início, disparava na frente. Fácil seria naquele momento apostar no fim da aliança oposicionista entre o PSDB e o DEM e no início da tese de Aécio do pós-Lula, a partir de um entendimento tucano-petista. Agora, o DEM agarra-se a Kassab como bóia de salvação para sacramentar a continuação da aliança oposicionista com o PSDB, Serra surfa com a vitória da sua tese, e Aécio amarga as conseqüências da sua aposta furada em Márcio Lacerda.

Até quando? Até a próxima mexida das nuvens. Era o ex-governador mineiro Magalhães Pinto que dizia que “política é igual nuvem; você olha, está de um jeito, olha de novo já está de um jeito diferente”. É claro que as eleições municipais deste ano projetam para 2010 um cenário favorável a José Serra. Ele é hoje líder nas pesquisas. Sua tese venceu no principal colégio eleitoral do país. No cenário político brasileiro, apesar de toda a popularidade de Lula, o PT continua com os mesmos problemas no Sul e no Sudeste que puderam levar o picolé de chuchu Geraldo Alckmin ao segundo turno em 2006. Na próxima eleição, o candidato da oposição tem bem maior consistência política que Alckmin. E o governo aposta num nome nunca testado nas urnas, com fama de durona e antipática, a ministra da Casa Civil, Dilma Roussef. Como porém, a eleição presidencial não é amanhã ...

Já se detecta um primeiro sinal de mexida de nuvem. Embora ela possa reforçar ainda mais a posição de Serra, é só um exemplo de como o quadro político nunca é estanque. A imensa força com a qual o PMDB saiu dessas urnas municipais coloca o PT completamente à mercê do velho partido dos caciques regionais. E o PT está apavorado com isso. Não apenas porque sabe que os peemedebistas, como sempre fazem, vão cobrar cara a fatura. Mas porque temem que o PMDB, como também gosta de fazer, volte a praticar seu esporte preferido de navegar com um pé em cada canoa. Em São Paulo, o PMDB optou pela candidatura de Kassab. Pode vir a fechar um acordo em 2010 com a chapa oposicionista para reservar uma vaga de senador para Orestes Quércia. Se fizer assim, vai caminhar em São Paulo no sentido oposto do propalado projeto nacional peemedebista de se associar à candidatura presidencial do governo. Primeiro passo para que, como aconteceu na eleição passada e em outras, o PMDB não consiga estar oficialmente em chapa nenhuma. Para poder de alguma forma estar em todas.

Se não tiver oficialmente o apoio peemedebista, o PT vai ter de procurar outros parceiros oficiais. A situação pode ressuscitar atores políticos que não se saíram tão bem nas eleições municipais. Não custa lembrar que o deputado Ciro Gomes é o nome da base governista que sempre aparece melhor nas pesquisas. Seu problema é que, diante do PMDB, seu fraquinho PSB não tem a menor chance de reivindicar nada ... Mas se o PMDB ficar de fora ... Ciro até pode vir a lembrar que é nome já testado e melhor colocado nas pesquisas, diante da aposta incerta em Dilma. Ou o PSB pode vir a compor com um vice de menor visibilidade e maior confiabilidade, como o governador de Pernambuco Eduardo Campos.

Aécio Neves também provavelmente não estará morto. Deve ter outras cartas na manga. Mesmo Alckmin, que pode ir para o PSB e reforçar o partido de Ciro num Estado em que ele não é forte. Em dois anos, ainda vai ventar um bocado para mexer com as nuvens no céu.